- Foi boa, filha. Simples, mas boa. Brincava jogos simples pelas calçadas e ruas, com os moleques descalços e pés sujos de lama, moleques tão simples e tão moleques como eu.
- E meus avós?
- Seus avós também eram pessoas simples, mas de bom coração. Lembro de sua vó cozinhando o prato preferido de seu avô e de vez em quando ela gritava: “Menina sai da rua!”.
- E meu vô?
- Seu vô era pessoa séria, de poucas palavras e muitos olhares. Carinhoso e sisudo. Nenhum dos dois tiveram muitos estudos, mas sempre me perguntavam: “Já fez o dever de casa?”, “Deixa eu ver as notas do bimestre”.
- Eles eram severos?
- Não muito. Acho que consegui o que eles queriam. Consegui ter mais estudos do que eles. Me formei, depois me formei de novo e depois mais uma vez. Acho que consegui o que eles sempre esperaram de mim.
- Mamãe, o que você espera de mim?
- Espero que você seja uma boa pessoa, minha filha, uma pessoa de bem, que leia bons livros, que seja integra, carinhosa, boa filha para se tornar uma boa mãe, e que principalmente estude, estude e estude mais ainda, para que possa ser alguém na vida.
- Então você quer que eu faça tudo o que vovó queria que você fizesse?
- Não! Não é isso... não...
- Por quê?
- Quero que você siga seu próprio caminho!
- Hum. Tá bom.
- ... não sei. Só sei que sinto muito a falta deles. E todas as noites ainda lembro da minha infância, da cidade onde nasci e morei, que por sinal é bem longe daqui. Toda vez que lembro da rua, de casa, de papai e mamãe, lá no meu quarto, com seu pai ao meu lado, toda vez que lembro... [acabo chorando].
- Mamãe porque a gente ainda está andando de ônibus?
- Porque a vida não é tão fácil assim, por mais que tentemos fazer as coisas certas, filhota, sempre acabamos errando pelo caminho, deixando de fazer certas coisas, tomando outros rumos. Mas, hoje, você vive em melhores condições do que eu vivi! Posso te dar coisas que não tive.[Engraçado, mamãe também me dizia isso].
- Então acho que é isso mesmo que eu quero, mãe, quero estudar, ser uma webdesigner e publicitária, fazer um MBA na Fundação Getúlio Vargas, depois fazer meu mestrado e tentar um doutorado sanduwich em Londres com uma bolsa da CAPES ou do CNPq...
- É isso mesmo minha filha, este é o seu caminho, siga-o, faça-o.
- Mãe, será que eu serei uma pessoa feliz?
- Lógico minha filha, lógico...
-Você é feliz?
- Sim, sou sim. E sou feliz só porque tenho você. Mas porque também você tem um pai que te ama. Porque posso lembrar de minha infância, de meus amigos, de seus avós, e depois... [chorar]... e depois...sorrir!
- Mamãe. Eu te amo!
- Eu também te amo, minha menina.
- Mãe, a gente tem que puxar a “campanhia”, já é o nosso ponto.
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3 comentários:
Gostei do papo...
É gostoso conversar assim né, do nada, sobre essas coisas simples.
Hunnf! Ai, ai...
(Risos)
Boa primo, vc escreve muito bem.
fala aí, manda só pra mim, prometo que não conto pra ninguém: de onde veio a inspiração?
Nossas vidas foram a inspiração, caro amigo, nossas vidas...
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